20140917

sobre sentir

Não me sinto poeta,
nunca aceitei de bom grado tal alcunha.
Não tenho o comprometimento necessário
com
a poesia.
Eu instrumentalizo o poema
para meus fins.
Não é maldade,
nem bondade.
Preciso disso para
sobreviver.
Regurgitar em algum canto
a realidade
a fumaça
os sonhos
que me adentram no dia-a-dia.

É como a bebedeira e a limpeza vindoura
do corpo.
É a necessidade de esvaziar,
como a necessidade do sexo,
da emoção e da realidade.
É o soco na cara de mim mesmo.

20140916

apocalipse

"Do you know that 'if'
is the middle word in 'life'?"


E sem um f - 
de fernando, 
de uma foda ruim, 
de fim 
de férias
ou fim de qualquer coisa que agrade,
ou só do fingimento que é
essa foda vida -
tudo vira uma mentira.

tecido


rasgar as fotos
é o preço da realidade
que superou o sonho que
rasgou a pele.



20140912

das rotinas às botinas

um café,
um paieiro,
três janelas de word.
não era esse o sonho. (?)

faltava-me as garrafas de vinho espalhadas pelo quarto,
latas amassadas com cerveja quente e cinzas na mesa,
a fétida existência de um apartamento
e de uma pessoa no meio dele.
falta a máquina de escrever tiquetaqueando poesia -
também suja e despudorada -
sabendo que esta poesia é mesmo
reflexo da vida vivida,
ao invés de dor fingida do que sente.

não quero estes prazos para entregas,
mas recuso a responsabilidade de abandoná-los.
fico aqui, digitando minhas tantas páginas de trabalho
de forma tão pitoresca, desencanada e humilhada,
faço como deveria ser;
até chegar
sexta-feira;
pois no fim de semana eu vivo poesia,
percorro carreiras, passeio de boca em boca,
levo tudo para a cabeça,
me embriagando em gente,
em transas, em tudo,
faço tudo o que me falta nos dias corridos
somente para sobreviver mais um pouco.

cobre

tenho uma vela acesa em meu quarto.
ela fica entre santos, cruzes, incensos,
coruja, cordões e pinga.
mas não sou um cara religioso.
a vela de mel
amarela, cheirosa,
acesa,
me força lembrar a perenidade
do ambiente
e o peso
do ar.

o peso da existência
nas coisas experimentadas
ou, ao menos,
tangíveis,
não está nelas.
o peso da existência está
naquilo que sabe
que sabe
que existe.

tenho uma chama de esperança
em meu peito.
creio que as coisas se resolvem
e se resolvem,
ou não,
não quero deixar que apague.

20140907

Samba sem cadência



Do amor ao soul,
em que brindamos com Tim,
um amor em samba antigo,
do tipo calmo e dengoso,
no nosso tempo, nossos risos,
também angústias e incertezas.
Foi o samba, sim,
palco de toda volúpia,
como a rua
e toda a boemia da noite,
motivo para mais outro dia.

Talvez não estivesse preparado
ou aquela dança não fosse minha;
que não sei sambar não é coisa nova
e que mexo as pernas conforme o som pede...
Mas acho que aquele samba,
naquela época, não era nosso
e o pisar em dedos cansou os pés.
E os passos mudaram de ritmo
e de direção com o tempo.
Quando perdemos a cadência
já não adiantava dançar
sem lá dentro a música tocar.

Um quase repente

Você meu amigo
aqui seria seu poema,
mas o papel ficou comigo,
creio que não há problema.
Você vem lá de muito longe
lugar que tem que sair cedo.
Se chove e eu tô sem galocha,
problema seu: eu fico e bebo!
Mas não me venha com papo de brocha,
de chifre, Rio ou coisa assim.
Você também já pisou na bola,
o jeito é rir sem fim!
Mas o que te falo agora,
falo sem encontrar a Sueli,
no papel do menino que chora
prá eu comprar amendoim.
Esse papo mais não rola,
escrevi sem precisão.
Fiz isto somente para,
que mesmo sem Maria Clara,
pudesse mostrar para um cuzão
que sem uma ideia mara
em alguns minutos eu fazia
em qualquer papel de pão
um lembrete para um amigão
que palavra sentida é poesia!